domingo, 15 de fevereiro de 2009

O PÉ DO BANDIDO

Becopress/Por Leonardo Sodré
Houve um tempo em Natal que as pessoas somente sabiam o que era a sensação de serem assaltados por meio do noticiário das grandes cidades, cinema e televisão. Natal jactava-se por ser um lugar pacífico, onde se podia dormir com as janelas abertas e nas praias, nem as portas eram fechadas.Esse tempo tranqüilo passou e a violência chegou à cidade. Hoje, as pessoas convivem com a incerteza da própria integridade física. Mas, é preciso viver, ir para frente e torcer para que um dia as autoridades entendam que têm que se mirar em exemplos de outros países, onde a tolerância é zero e bandidos são tratados como bandidos.Mas, existem pessoas que nunca se preocupam com isso, até passarem pela experiência de um ato de violência. O artista plástico e poeta Eduardo Alexandre (Dunga), que adotou a Redinha Nova para viver, nunca imaginou que um dia seria alvo de meliantes. Foi assaltado por bandidos enraivecidos que roubaram até o seu mosquiteiro.Os bandidos reviraram a casa inteira e levaram de tudo: computador, telefone, dinheiro, muita coisa. E, na afobação, um deles pisou numa tela que Dunga estava começando a pintar com a ajuda de ‘Rastilho de Pólvora’ e ‘Pavio Curto’, seus dois cães da raça São Bernardo Praieiro, que correm sobre as telas modernas do artista em troca de bolachas “cream cracker”, com margarina.Quando os assaltantes foram embora, Dunga, que vive assistindo séries policiais na televisão, recolheu a imensa tela, com a marca do pé do bandido e sentenciou: “aqui está a evidência para identificar os autores do assalto”. Foi uma luta danada para amarrar a obra semicomeçada em cima do Volkswagen Santana, com aquela marca preta de um pé descalço de muitas estradas.Ele havia colocado um tom suave de amarelo e ‘Rastilho de Pólvora’ já havia caminhado duas vezes por cima da tela, com as patas untadas de tinta preta. O efeito, depois do pé gravado do assaltante era interessante; como se Saci Pererê da infância do artista tivesse pisado num solo marciano, junto com um cachorro. De acordo com a avaliação do pintor Franklin Serrão, “tratou-se da melhor obra de Dunga”, disse sério, inacreditavelmente.Quando Dunga chegou à delegacia todo afobado, junto com Márcia, a dona do seu coração, cada um segurando num pedaço da tela de quatro metros quadrados, foi preciso abrir uma janela lateral, bem larga, para poder colocar a obra diante do delegado, que estava no seu gabinete de trabalho.“Pronto autoridade, aqui está o pé do ladrão para o senhor identificá-lo!” Disse Dunga por trás tela, que era maior do que ele. O delegado levantou-se e olhou demoradamente a obra do ladrão e do cachorro. Sem dizer nada, sentou-se e disse:- Minha mulher vai dizer que eu estou ficando doido, mas quanto é mesmo essa pintura?Quando chegou a casa, dinheiro no bolso, Márcia foi se encaminhando para tomar um banho e enquanto Dunga já estava mexendo no estoque de telas, todas enormes.- Vai para onde meu amor? Perguntou a Márcia.- Vou tomar um banho e volto já...- Não ouse lavar o pé e vá chamar Rastilho de Pólvora...

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